sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

PLANO DECENAL

VISÃO DE FUTURO DO SISTEMA ELÉTRICO
Os responsáveis pelo planejamento do Sistema Elétrico Brasileiro (MME, ANEEL, EPE, ONS, etc.) vêm tentando suprir as deficiências de energia do Sudeste e Nordeste pela extensão do atual sistema interligado, concentrando a produção em usinas de grande porte da bacia Amazônica.
Ora, estas são usinas concentradoras que não concorrem para constituição de estoques, principal estratégia do planejamento do Sudeste.
Em seu trabalho premiado “Energia para o desenvolvimento” de 1980 — no pleno auge do choque do petróleo — o professor Goldemberg já alertava sobre as causas e conseqüências do elevado endividamento externo, em razão da concentração dos empreendimentos hidroelétricos em obras de grande porte. Mas o risco dos sistemas majoritariamente hidroelétricos não depende do clima apenas nos aspectos de manutenção de “energia garantida”, como tambem dos acidentes que o clima pode produzir sobre as linhas de transmissão como furacões, raios e tempestades.

não existem mais locais onde a água possa ser represada em altitudes capazes de constituir estoques de energia potencial. Com isso, a extensão do sistema Sudeste à região Norte fica comprometida por perder a sua principal finalidade que são os reservatórios de acumulação. Mesmo que algum local fosse encontrado no Norte a energia potencial não seria transferível por falta de conexão física (geográfica), inclusive entre bacias dos rios isolados do Norte de mesma sazonabilidade.

Custa muito manter um sistema elétrico baseado apenas em potenciais hidráulicos. Requer condições muito especiais somente encontrados em raros lugares do mundo. Parece até um milagre o Brasil permanecer, por mais de 40 anos, isolado na posição invejável que desfruta no contexto da imensa maioria de países. Será que só o Brasil está certo e os demais estão errados por terem suas matrizes comprometidas com combustível fóssil? Ou será que está confiando demais em seus recursos naturais e pagando alto preço ao prolongar demasiadamente a “(mono) cultura da hidroeletricidade”? Essa é mais uma das inúmeras “doenças holandesas” de que tem sido vítima a economia brasileira desde os tempos coloniais: o culto das riquezas naturais. O Brasil não precisa ficar escravo da monocultura da hidroeletricidade para salvar as aparências.

Para justificar a construção de grandes hidroelétricas na Amazônia o presidente da EPE tenta intimidar ambientalistas com a construção de térmicas mais poluentes, como se fossem alternativas mutuamente excludentes.

Devemos reconhecer que foi graças a atuação dos ambientalistas que os reservatórios foram reduzidos nas usinas do Rio Madeira e em Belo Monte.
Porque só agora o presidente EPE revela — num claro pedido de desculpas — que “a matriz está se sujando”, com aumento da participação de combustíveis fósseis?
Não poderia ter “sujado” antes, como muitos países o fizeram no século passado?
Porque não “sujar”, de forma consciente, agora que pode contar com os combustíveis, gás e álcool, que brevemente se tornarão subprodutos da exploração de petróleo e da cana de açúcar?


Estender à Região Amazônica o grande sistema interligado significa um retorno a práticas que deram certo no passado, mas que hoje são inviáveis devido baixa sinergia dos rios amazônicos. O sistema ampliado perde uma das suas principais qualidades: a grande sinergia representada pelo estoque energia potencial dos reservatórios de acumulação. A interligação com o Norte só agrava os riscos operacionais que já se manifestam no Sudeste pela sua elevada concentração.
Existem várias maneiras de aumentar a capacidade de produção (sinergia) de um sistema, buscando principalmente a complementaridade:
• A primeira e mais evidente é contar com várias fontes de suprimento, inclusive importação. Quanto mais diferentes mais complementares.
• Armazenamento antecipado de energia potencial por meio de grandes reservatórios. Estratégia utilizada com pleno êxito no Sistema Sudeste que permitiu a construção escalonada de usinas de fio d’água ao longo do tempo e espaço..
• Intercâmbio de energia elétrica complementar pela sazonalidade. Caso pretendido pelos atuais planejadores do grande Sistema Interligado Brasileiro.
• Complementação térmica de sistema puramente hidroelétrico.
• Economia no consumo de combustível de térmicas pré-existentes por usinas de fio d’água supermotorizadas. Caso do aproveitamento sustentável dos potenciais amazônicos (low profile).
• Supermotorização de hidroelétricas atuais para fins estratégicos. A supermotorização permite a utilização dos reservatórios no máximo de sua capacidade em ocasiões de emergência ou produção de bens estratégicos em situação de vertimento de água nas usinas.
Resumindo:
— Reservatório de acumulação é a forma complementar de aumentar a sinergia nos sistemas predominantemente hidroelétricos.
— Intercâmbio é a forma de aumentar a sinergia de regiões complementares pela sazonalidade.
— Termoelétricas e hidroelétricas de fio d’água são complementares em ambos os sentidos.
A energia elétrica é uma forma intermediária que, em princípio, não pode ser armazenada. Uma vez produzida tem de ser consumida no instante da produção. Entretanto existem pelo menos 3 maneiras de armazenar energia elétrica por meios indiretos:
• Armazenamento da própria energia elétrica em baterias de veículos elétricos.
• Armazenamento antecipado dos “meios” de produzir energia elétrica, sem a necessidade imediata da construção de usinas completas.
• Armazenamento “dos fins” ou estoque de energia sob forma de produtos acabados que a eletrólise da energia elétrica é capaz de produzir.

Qualquer uma dessas constitui alternativa promissora para aproveitamento da energia vertida por usinas hidroelétricas quando os reservatórios perderem importância. Esta é uma oportunidade que não tem sido aproveitada devido a teimosia em permanecer dependente da monocultura da eletricidade.